O
fogão à lenha a chaleira de ferro em ebulição. Na beira do fogão um suporte
sustentava o coador feito do pano branco do saco de açúcar. Sobre o coador a
chaleira despejava suas lagrimas fumegantes sobre o pó preto do puro café do
quintal. O aroma se espalhava pelo caminho da roça. Era o café da preta Sinhá no
fim da tarde. Ainda posso vê-la com lenço branco a cobrir a cabeleira cinza,
ela sabia que era a hora do Ângelus e entoava a Ave Maria com voz rouca, que
tenho guardada ainda comigo.
Um
aceno de mão era convite para um café com um bolo feito enrolado na folha da
bananeira e adoçado com a rapadura feita ali no terreiro. Eu sempre aceitava a ouvir
mais uma de suas historias de tempos passados, que ela descrevia com riqueza de
detalhes, que me faziam adentrar no túnel do tempo, para lhe compreender e
reviver cada emoção que seus olhos já cinzas traduziam em saudosismo.
Era
assim todas as tardes na minha volta para casa, com meu corpo cansado da labuta
diária aquele café era analgésico e suas conversas me colocavam num banco de
escola sobre historias, que a escola me negava. Não via lagrimas em seus olhos,
nem mesmo um sopro de ódio de todas as injustiças e maldades sofridas numa
época de servidão. Seu sorriso escondia todas as mazelas, como arte de não se
entregar a nenhum tipo de angustia. A velha Sinhá tinha arte de refazer sua
alegria.
Mas
logo o véu negro da noite cobria a serra ao longe e Sinhá Preta já preparava a
lamparina a querosene, seguida por um gato rajado que enroscava em sua perna
enquanto andava. Eu observava cada detalhe desta senhora de olhar calmo e que
adorava contar historias. Uma Lua deixava cair seus raios sobre a roça. Olho
para o meu caminho e ela com um sorriso entendia minha despedida. Levava a mão
direita sobre minha testa balbuciava alguma forma de benção.
Mas um dia não
havia mais fumaça branca na chaminé, nem o aroma de café pelo ar e meu aceno de mão ficou
parado no ar.
Dona Sinhá partira.
Toninho.
25/01/2017
Inspirado na imagem de uma chaleira de ferro no Instagram.
Meu outro blog: Momentos e inspirações
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Uma boa semana
para todos.
Toninho,
ResponderExcluirLendo esse lindo texto, pude sentir o aroma e o sabor do café. Era desse jeito na fazenda de meus falecidos avós.
Hoje em dia, a chaminé também está apagada. Eles partiram há alguns anos. Mas, ficaram as lindas lembranças.
Muito linda a sua inspiração.
Abraços
Olá Toninho,
ResponderExcluirEstou encantada com seu belo texto, que por alguns segundos lembrei de minha querida bisa, quase todas as tardes que junto com o café tinha o bolo de fubá ou os pastéis para agradar sua bisneta querida...Muito bom você trazer isso a minha memória através do seu texto.
Grande beijo
Bom dia caro amigo Toninho ao ler tão belo momento viajei no tempo onde a simplicidade da vida reinava ,às vezes necessitamos de regredir no tempo para atenuar o vazio que assola por momentos o nosso coração, um grande abraço felicidades
ResponderExcluirLindo e deu pra nos sentir vendo o aceno daquela velha mão convidando pro café e estar ali...Até a bênção na testa e o gato enroscado lembraste.;.. Fizeste uma magnífica viagem com essa ilustração e nos levaste junto! ADOREI! abração,chica
ResponderExcluirQue lindo, de emocionar, senti em todos os sentidos minha avó, minha mãe nessa linda história, e o cheiro do café??? emocionou.
ResponderExcluirvida vivida e bem, mas com o final de todos nós!
Ainda tenho a chaleira de ferro de minha avó, e o bule de minha mamis!
abraços com carinho!
Amigo é ter e sentir o sentimento de boas saudades, sabe amigo parece que o cheirinho a café passou para a minha sala de jantar, você e Gracita são DEMAIS diria mesmo que BRINCAM COM AS PALAVRAS.beijinhos e um forte abraço.
ResponderExcluirMaravilhosa inspiração, Toninho!
ResponderExcluirFez-me lembrar duas grandes amigas minhas e da minha mãe... que já partiram... todas as tardes de sábado a gente sempre passava por casa delas, colocando a conversa em dia, ouvindo suas histórias, e elas sempre nos aguardavam com um café ou um chá bem especiais e bolos caseiros, que eram uma delícia... sua descrição levou-me a esses tempos bons... nem faltou o gato... o Piruças... que pertencia a uma delas... e que sempre amarinhava para o meu colo...
Pura delícia, este post, Toninho!
Um grande abraço! Continuação de uma boa semana!
Ana
Toninho...este texto está simplesmente... Maravilhoso!
ResponderExcluirRecuei no tempo e "bateu" uma saudade!
Bj
Maravilhoso texto, memórias plenas de saudade e carinho.
ResponderExcluirLembrou-me os tempos da minha avô.
Beijinhos
Maria
Puxa que belo texto que li agora.
ResponderExcluirOs olhos marejaram e eu fui fundo na tua narrativa como, como, alguém querendo água para matar a sede.
Toninho obrigada por essa leveza e aconchegante sentir. Parecia que estava assistindo um filme de época que adoro.
Beijinho ❤️
Nossa, Toninho, viajei. Que criatividade! Lembrei-me de algo semelhante da minha infância. E o cheiro de café, quase pude sentir. 10.
ResponderExcluirAh, meu amigo, que palavras lindas, como você é talentoso, bateu uma certa nostalgia e uma lembrança de um passado já bem distante e apagado.
ResponderExcluirUm abração.
Oi amigo, Que conto lindo eu me coloquei no lugar da criança, pois minha vó era mais ou menos assim.
ResponderExcluirQuanto ao meu blog digo: perdoar depende do coração e o tempo ajuda. Agora esquecer: nunca
Beijos no coração
Minicontista2
Texto fantástico Toninho \o/
ResponderExcluirIncrível como a imagem de uma chaleira de ferro
pode trazer tamanha inspiração. Achei emocionante.
Beijos!
Texto com uma inspiração ótima... Há vida, sensibilidade e afetos... Muita beleza e felicidade envolvendo cada parágrafo...
ResponderExcluirUm grande abraço
Deus pra voltar no tempo, senti o cheiro de café pilado no quintal por meu avô e feito no fogão á lenha de minha vó. Oh saudade
ResponderExcluirUm verdadeiro conto em forma de poema. Parecia muito real, bjs
ResponderExcluirAmigo Toninho,
ResponderExcluirA sua escrita tem o dom de sempre me emocionar.
Este seu maravilhoso texto causou-me um arrepio de emoção, pela descrição tão sentida e tão bem elaborada de uma Mulher que o marcou de forma tão bonita e positiva.
Bem-haja!
Beijinho grato
.
Amigo este seu texto fez-me lembrar o
ResponderExcluirmeu tempo de menina e a m/mãe e o seu
café cujo sabor não voltei a sentir,desde
que ela partiu.
Gostei muito.
Bom abraço
Irene Alves
Terno amigo,
ResponderExcluir"E um dia chegou
acenou
ninguém respondeu
e de mão parada ficou
E Dona Sinhá morreu"...
Terno seu canto de amor!
Maria Luísa Adães
UN RELATO DE LA TIERRA.
ResponderExcluirABRAZOS
Lamento a sua saudade, Toninho, mas é um mal de que também sofro, embora com recordações diferentes...
ResponderExcluirÉ emocionante a sua ternura na descrição do relacionamento com sua Sinhá...
Revejo-me na «arte de não se entregar a nenhum tipo de angústia» e na «arte de refazer a sua alegria»...
Há sempre vidas com mais espinhos...
Gosto tanto de ler os seus poemas, como a sua prosa poética... Um verdadeiro deleite...
Um excelente fim de semana, querido amigo.
Abraço e beijos de paz.
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Ps ~ Gostava de publicar no meu perfil do G+. Há dias publiquei um poema seu e como não agradeceu, não sei se é do seu agrado.,,
Olá Toninho,
ResponderExcluirNão sei porque ainda me surpreendo com as suas belas e tocantes inspirações.
Ao ler a prosa poética fui remetida, no início, à minha infância, onde também estavam presentes o fogão, a chaleira e o coador de pano.
Sua descrição é tão envolvente que pude acompanhar todo o cenário da prosa. Vi até o gato
rajado se enroscando na perna da Dona Sinhá.
Lindamente melancólico!
Ótimo final de semana!
Abraço.
Amigo Toninho, não preciso dizer que gostei muito desta tua crônica, que chegou a me colocar na mesa junto a Sinhá Preta, para tomar o seu café puro e comer o seu bolo, feito para o café da tarde. Um dia a Preta Velha partiu, deixando saudade. Parabéns, Toninho.
ResponderExcluirUm grande abraço.
Pedro
Linda história, Toninho.
ResponderExcluirMe fez lembrar os fogões de lenha dos meus avós no sitio. Aquele cheirinho de café, de bolo, melado e aquelas coisas todas da roça. Que saudade!
Bjk e um abraço dos bons!
Olá Toninho, que lindas,lembranças. Menino , voltei no tempo, na casa da roça onde fui criada, era assim mesmo, fogão de lenha, café torrado e pisado no pilão, e por ai vai! Senti saudades do meu pai!
ResponderExcluirAdorei milhões!
Desejo bom domingo
bjs no coração amigo.
Bom dia Toninho.
ResponderExcluirAcho que todos nós viajamos ao passado pela sua bela crónica cheia de emoção onde a sua escrita cheia de detalhes nos fez vivenciar em pensamentos tomando um verdadeiro café feito como bálsamo para aliviar o cansaço e apreender com a senhora é suas experiências. Amei meu amigo a sua crónica. Um lindo domingo e feliz semana. Abraços.
Bom dia Toninho.
ResponderExcluirAcho que todos nós viajamos ao passado pela sua bela crónica cheia de emoção onde a sua escrita cheia de detalhes nos fez vivenciar em pensamentos tomando um verdadeiro café feito como bálsamo para aliviar o cansaço e apreender com a senhora é suas experiências. Amei meu amigo a sua crónica. Um lindo domingo e feliz semana. Abraços.
Uma bela cronica que nos remete a lugares e rotinas que foram tecidas muito bem por vc.
ResponderExcluirBoa Noite, amigo Toninho!
ResponderExcluirOntem já pensei nisso e muito: minha amada tia se foi... saudade imensa também...
Um poema belo simplesmente!
Bjm muito fraternal
Linda e doces recordações que se perpertuaram.
ResponderExcluirParabéns pelo belo escrito. Amei ler aqui e na Chica
Amo vc e Deus ainda mais.
Um bom domingo.